domingo, dezembro 31, 2006

Wer leidet, leidet allein.

Obwohl ich mir nie über diejenigen, die sich meine Freunde nannten, Illusionen gemacht habe, war ich doch immer imstande, von ihnen enttäuscht zu werden - so verwickelt und subtil ist meine Leidensfähigkeit. Da ich nie in mir Eigenschaften entdeckt habe, die jemanden anziehen konnten, konnte ich auch nie glauben, dass sich jemand von mir angezogen fühlen könnte. Diese Meinung verriet törichte Bescheidenheit, wenn sie nicht von immer neuen Vorkommnissen - jenen unerwarteten Vorkommnissen, die ich erwartet hatte - wieder und wieder bestätigt worden wäre.

O que chora, chora só.

Embora nunca tivesse ilusões a respeito daqueles que se diziam meus amigos, consegui sempre sofrer desilusões com eles - tão complexo e sutil é o meu destino de sofrer. Nunca duvidei que todos me traíssem; e pasmei sempre quando me traíram. Quando chegava o que eu esperava, era sempre inesperado para mim. Como nunca descobri em mim qualidades que atraíssem alguém, nunca pude acreditar que alguém se sentisse atraído por mim. A opinião seria de uma modéstia estulta, se fatos sobre fatos - aqueles inesperados fatos que eu esperava - a não viessem confirmar sempre.

domingo, setembro 10, 2006

Edgar Allan Poe
tradução de Oscar Mendes

Não fui, na infância, como os outros
e nunca vi como outros viam.
Minhas paixões eu não podia
tirar de fonte igual à deles;
e era outra a origem da tristeza,
e era outro o canto, que acordava
o coração para a alegria.
Tudo o que amei, amei sozinho.
Assim, na minha infância, na alba
da tormentosa vida, ergueu-se,
no bem, no mal, de cada abismo,
a encadear-me, o meu mistério.
Veio dos rios, veio da fonte,
da rubra escarpa da montanha,
do sol, que todo me envolvia
em outonais clarões dourados;
e dos relâmpagos vermelhos
que o céu inteiro incendiavam;
e do trovão, da tempestade,
daquela nuvem que se alteava,
só, no amplo azul do céu puríssimo,
como um demônio, ante meus olhos.

domingo, julho 16, 2006

Reservo-me o domingo para a busca

António Rebordão Navarro

Reservo-me o domingo para a busca
receosa e teimosa da alegria.
Meu coração devia ser alegre
como um pássaro novo,
meu coração devia ser alegre
como o vinho ou o fogo
No entanto, onde está a alegria?
onde estão as sementes da alegria?
onde vive a alegria? No entanto,
pergunto às coisas e às gentes
de domingo onde está a alegria.
Mesmo que a não encontre
destino-lhe o domingo,
este e outros domingos,
este sol e outros ventos,
este mar e outras ruas,
estas mãos e estes olhos.
Assim acho razão para não estar triste.



António Rebordão Navarro
O Dia Dentro da Noite
Poemas (1952 - 1982)
Imprensa Nacional Casa da Moeda

domingo, julho 09, 2006

O Canto da Noite

Friedrich W. Nietszche

"É noite; agora eleva−se mais a voz das
fontes. E a minha alma é também uma
fonte.

É noite; agora despertam todos os
cantos dos amantes. E a minha alma é
também um canto de amante.

Há qualquer coisa em mim não aplicada
nem aplicável, que quer elevar a voz.
Há em mim um anelo de amor que fala
a linguagem do amor.

Eu sou luz. Ah! se fosse noite! Mas é
esta a minha soledade: ver−me rodeado
de luz.

Ah! se eu fosse sombrio e noturno!
Como sorveria os seios da luz! E
também vos bendiria a vós, estrelinhas
que brilhais lá em cima como pirilampos!
E seria venturoso com vossos mimos de
luz.

Eu, porém, vivo da minha própria luz,
absorvo em mim mesmo as chamas que
de mim brotam.

Eu não conheço o prazer de receber, e
freqüentemente tenho sonhado que
roubar deve ser ainda maior deleite do
que receber.

A minha pobreza reside em que a minha
mão nunca se cansa de dar, a minha
inveja são os olhos que vejo esperando,
e as noites vazias do desejo.

Ó, miséria de todos os que dão! Ó,
eclipse do meu sol! Ó, desejo de
desejar! Ó, fome devoradora na fartura!
Eles recebem de mim; mas, acaso lhes
tocarei eu sequer a alma? Entre dar e
receber há um abismo; e é muito difícil
transpor o menor abismo.

Nasceu um homem da minha beleza:
quereria prejudicar os que ilumino;
quereria saquear os que cumulo de
presentes: assim tenho ânsia de
maldade.

Retirando a mão, quando a mão já se
estende; vacilando como a cascata que
vacila até na sua queda; assim eu tenho
sede de maldade. Tais vinganças
medita a minha exuberância; tais
malícias nascem da minha solidão.

O meu prazer de dar morreu à força de
dar; a minha virtude cansou−se de si
mesma por sua própria exuberância.
O que dá sempre corre perigo de perder
o pudor; aquele que reparte sempre, à
força de repartir acaba por se lhe
calejarem as mãos e o coração.

Os meus olhos já se não arrasam de
lágrimas ao ver a vergonha dos que
imploram; a minha mão endureceu
demais para experimentar o tremor das
mãos cheias.

Para aonde foram as lágrimas dos meus
olhos e a plumagem do meu coração?
Ó, soledade de todos que dão! Ó,
silêncio dos que brilham! Muitos sóis
gravitam no espaço vazio; a sua luz fala
a tudo que é obscuro; só para mim
emudeceu.

Ó! É a inimizade da luz contra o
luminoso! Desapiedada, segue o seu
caminho. Profundamente injusto contra
o luminoso, frio para com os sóis, assim
caminha todo o sol. Como uma
tempestade voam os sóis por suas
órbitas: é esse o seu caminho. Seguem
a sua vontade inexorável: é essa a sua
frialdade.

Ai, só vós obscuros e noturnos, que
tirais o vosso calor do luminoso, só vós
bebeis o leite balsâmico dos úberes da
luz!

Ai, há gelo em torno de mim, gelo que
queima as minhas mãos! Tenho uma
sede que suspira por vossa sede!
É noite. Ai! Por que hei de eu ser a luz?
E sede do noturno! E soledade!

É noite... como uma fonte, brota o meu
anelo − meu anelo de fulgor.
É noite: agora eleva−se mais a voz das
fontes; e a minha alma é também uma
fonte.

É noite: agora despertam todos os
cantos dos namorados. E a minha alma
é também um canto de namorado".

Assim falou Zaratustra.

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Fonte: Nietszche, Friedrich Wilhelm. Assim falou Zaratustra. Ed. Rideel, São Paulo, 2005.

segunda-feira, julho 03, 2006

Miss Sarajevo

U2

Is there a time for keeping your distance
A time to turn your eyes away.
Is there a time for keeping your head down
For getting on with your day.

Is there a time for kohl and lipstick
A time for cutting hair
Is there a time for high street shopping
To find the right dress to wear.

Here she comes, heads turn around
Here she comes, to take her crown.

Is there a time to run for cover
A time for kiss and tell.
Is there a time for different colours
Different names you find it hard to spell.

Is there a time for first communion
A time for East 17
Is there a time to turn to Mecca
Is there time to be a beauty queen.

Here she comes, beauty plays the clown
Here she comes, surreal in her crown.

"Dici che il fiume trova la via al mare
E come il fiume giungerai a me
Oltre i confini e le terre assetate
Dici che come fiume
Come fiume...
L'amore giungera
l'amore...
E non so più pregare
E nell'amore non so più sperare
E quell'amore non so più aspettare."

Is there a time for tying ribbons
A time for Christmas trees.
Is there a time for laying tables
And the night is set to freeze.

sábado, junho 10, 2006

Momento

David Mourão Ferreira

Chegado o momento
em que tudo é tudo
dos teus pés ao ventre
das ancas à nuca
ouve-se a torrente
de um rio confuso
Levanta-se o vento
Comparece a lua
Entre linguas e dentes
este sol nocturno
Nos teus quatro membros
de curvos arbustos
lavra um só incêndio
que se torna muitos
Cadente silêncio
sob o que murmuras
Por fora por dentro
do bosque do púbis
crepitam-me os dedos
tocando alaúde
nas cordas dos nervos
a que te reduzes
Assim o momento
em que tudo é tudo
Mais concretamente
água fogo música

terça-feira, junho 06, 2006

The Number of The Beast

Iron Maiden

Woe to you, Oh Earth and Sea,
For the Devil sends the beast with wrath
Because he knows the time is short...
Let him who hath understanding reckon
The number of the beast
For it is a human number
Its number is Six hundred and sixty six.
(Revelations ch. XIII v. 18)

I left alone my mind was blank
I needed time
To get the memories from my mind
What did I see can I believe
That what I saw that night was real
And not just fantasy
Just what I saw in my old dreams
Were the reflections of my warped mind
Staring back at me
Cos in my dreams it's always there
The evil face that twists my mind
And brings me to despair

The night was black was no use holding back
Cos I just had to see was someone watching me
In the mist dark figures move and twist
Was all this for real or some kind of hell

666 the Number of the Beast
Hell and fire was spawned to be released

Torches blazed and sacred chants were praised
As they start to cry
Hands held to the sky
In the night the fires burning bright
The ritual has begun
Satan's work is done
666 the Number of the Beast
Sacrifice is going on tonight

This can't go on I must inform the law
Can this still be real or some crazy dream
But I feel drawn
Towards the evil chanting hordes
They seem to mesmerise me...
Can't avoid their eyes
666 the Number of the Beast
666 the one for you and me

I'm coming back I will return
And I'll possess your body
And I'll make you burn
I have the fire I have the force
I have the power
To make my evil take its course

sexta-feira, maio 26, 2006

Congresso Internacional do Medo

Carlos Drummond de Andrade

Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio porque esse não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte,
depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas.

sábado, maio 20, 2006

Poema dos dons

Jorge Luis Borges
(tradução de Paulo Mendes Campos)

Graças quero dar ao divino
labirinto de efeitos e causas
pela diversidade das criaturas
que formam este singular universo,
pela razão, que não deixará de sonhar
com um plano para o labirinto,
pela face de Helena e a perseverança de Ulisses,
pelo amor, que nos deixa ver os outros
como os vê a divindade,
pelo firme diamante e água solta,
pela álgebra, palácio de precisos cristais,
pelas místicas moedas de Ângelo Silésio,
por Schopenhauer,
que talvez decifrou o universo,
pelo fulgor do fogo,
que nenhum ser humano pode olhar sem assombro antigo,
pelo mogno, o cedro, o sândalo,
pelo pão e o sal,
pelo mistério da rosa
que prodigaliza cor e não a vê,
por certas vésperas e dias de 1955,
pelos duros tropeiros que na planície fustigam os animais e a alva,
pela manhã em Montevidéu,
pela arte da amizade,
pelo último dia de Sócrates,
pelas palavras que no crepúsculo disseram
de uma cruz a outra cruz,
por aquele sonho do Islã que abarcou
mil e uma noites,
por aquele outro sonho do inferno,
da torre do fogo que purifica
e das esferas gloriosas,
por Swedenborg,
que conversava com os anjos nas ruas de Londres.
pelos rios secretos e imemoriais
que convergem em mim,
pelo idioma que, há séculos, falei em Nortúmbria,
pela espada e a harpa dos saxônios,
pelo mar, que é um deserto resplandecente
e uma cifra de coisas que não sabemos
e um epitáfio dos vikings,
pela música verbal da Inglaterra,
pela música verbal da Alemanha, pelo ouro que reluz nos versos,
pelo inverno épico,
pelo nome de um livro que não li: Gesta Dei per Francos,
por Verlaine, inocente como os pássaros,
pelos prismas de cristal e o peso de bronze,
pelas raias do tigre,
pelas altas torres de São Francisco e da ilha de Manhattan,
pela manhã no Texas,
por aquele sevilhano que redigiu a Epístola Moral
e cujo nome, como ele houvera preferido, ignoramos,
por Sêneca e Lucano de Córdoba,
que antes do espanhol escreveram
toda a literatura espanhola,
pelo geométrico e bizarro xadrez,
pela tartaruga de Zenão e o mapa de Royce,
pelo odor medicinal do eucalipto,
pela linguagem, que pode simular a sabedoria,
pelo esquecimento, que anula ou modifica o passado,
pelo hábito,
que nos repete e nos confirma como um espelho,
pela manhã, que nos proporciona a ilusão de um começo,
pela noite, sua treva e sua astronomia,
pelo valor e a felicidade dos outros,
pela pátria, sentida nos jasmins
ou numa velha espada,
por Whitmann e Francisco de Assis, que já escreveram o poema,
pelo fato de que o poema é inesgotável
e se confunde com a soma das criaturas
e jamais chegará ao último verso
e varia segundo os homens,
por Francisco Haslam, que pediu perdão aos filhos
por morrer tão devagar,
pelos minutos que precedem o sono,
pelo sono e pela morte,
esses dois tesouros ocultos,
pelos íntimos dons que não enumero,
pela música, misteriosa forma do tempo.

sábado, maio 13, 2006

It's Too Late



Wilson Pickett

It's too late
Said it's too late, yes it is
My love is gone away to stay
Don't you know it's too late now
Listen, children, I wanna tell you this
It's too late to cry
It's too late to cry now
My love is gone away, yes she has

I just guess that you're wonderin' why I always sing a sad song But you see, I had a woman who was very good to me and I can remember the times she used to sit down and tell me these words: Said, "Pickett, I want you to know I love you from the bottom of my heart and whatever you need, I don't want you to go to your mother, your father, your sister or your brother...
I'll be a leadin' pull when you're fallin' down. When all your money's gone, I want you to know you can count on me"
But I didn't appreciate that woman then. You know what? I had to run and chase after every little girl around town. So finally one day I got home and I found my little girl gone and people, you know it hurt me so bad (ha ha) I had to hang my little head and cry. Then I began to read the letter she left for me layin' there;
it read like this, children

It's too late, she's gone, oh
(she's gone)
"It's too late I'm gone away"
(she's gone)
Ah yeah (too late) don't you know it, children
(too late)
Yeah yeah yeah yeah yeah yeah
Say it one more time

(too late)
listen
(too late)
I wanna hear you understand what I'm talkin' about
(too late)

sábado, abril 29, 2006

A casada infiel

Federico García Lorca

E eu que a levei ao rio
supondo fosse donzela,
quando já tinha marido.
Era noite de São Tiago
e foi quase um compromisso.

Apagaram-se os faróis
e se acenderam os grilos.
Já nas últimas esquinas
toquei-lhe os peitos dormidos,
e se me abriram de pronto
como ramos de jacintos.
Polvilho de sua anágua
vinha ranger-me no ouvido
tal como um corte de seda
por dez lâminas rompido.
Sem luz de prata nas copas
os troncos tinham crescido,
e um horizonte de cães
ladrava longe do rio.
Atravessando o silvado,
por entre juncos e espinhos,
sob a sua cabeleira
fiz uma concha no limo.
Tirei a minha gravata.
Ela tirou seu vestido.
Eu, o cinto com o revólver.
Ela, seus quatro corpinhos.
Nem nardos nem caracóis
têm uma cútis tão fina
nem sob a lua cristais
relumbram com tanto brilho.
Suas coxas me escapavam
como peixes surpreendidos,
metade cheias de lume,
metade cheias de frio.
Naquela noite corri
pelo melhor dos caminhos,
montado em potra de nácar,
sem freios e sem estribos.
Não quero dizer, sou homem,
as coisas que ela me disse.
É que a luz do entendimento
me torna mui comedido.
Suja de beijo e de areia,
levei-a dali do rio.
Em luta com o ar, batiam-se,
brancas espadas, os lírios.
Portei-me como quem sou.
Como gitano legítimo.
Dei-lhe estojo de costura,
grande, de fina palhinha,
mas não quis enamorar-me,
porque, já tenho marido,
me disse que era donzela
quando eu a levava ao rio.

(tradução de Carlos Drummond de Andrade)
Da revista: "Poesia Sempre", nº 7, Fundação Biblioteca Nacional, 1996, RJ

sexta-feira, abril 21, 2006

The Garden Of Love

William Blake

I laid me down upon a bank,
Where Love lay sleeping;
I heard among the rushes dank
Weeping, weeping.

Then I went to the heath and the wild,
To the thistles and thorns of the waste;
And they told me how they were beguiled,
Driven out, and compelled to the chaste.

I went to the Garden of Love,
And saw what I never had seen;
A Chapel was built in the midst,
Where I used to play on the green.

And the gates of this Chapel were shut
And "Thou shalt not," writ over the door;
So I turned to the Garden of Love
That so many sweet flowers bore.

And I saw it was filled with graves,
And tombstones where flowers should be;
And priests in black gowns were walking their rounds,
And binding with briars my joys and desires.

quinta-feira, abril 06, 2006

Transforma-se o amador na cousa amada

Luís de Camões

Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si sómente pode descansar,
Pois consigo tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semideia,
Que, como o acidente em seu sujeito,
Assim co'a alma minha se conforma,

Está no pensamento como ideia;
[E] o vivo e puro amor de que sou feito,
Como matéria simples busca a forma.

sábado, março 25, 2006

quatro e meia da manhã

Charles Bukowski

os barulhos do mundo
com passarinhos vermelhos,
são quatro e meia da
manhã,
são sempre
quatro e meia da manhã,
e eu escuto
meus amigos:
os lixeiros
e os ladrões
e gatos sonhando com
minhocas,
e minhocas sonhando
os ossos
do meu amor,
e eu não posso dormir
e logo vai amanhecer,
os trabalhadores vão se levantar
e eles vão procurar por mim
no estaleiro
e dirão:
"ele tá bêbado de novo",
mas eu estarei adormecido,
finalmente, no meio das garrafas e
da luz do sol,
toda a escuridão acabada,
os braços abertos como
uma cruz,
os passarinhos vermelhos
voando,
voando,
rosas se abrindo no fumo
e
como algo esfaqueado e
cicatrizando,
como 40 páginas de um romance ruim,
um sorriso bem na
minha cara de idiota.

sábado, março 11, 2006

Atitude

Cecília Meireles

Minha esperança perdeu seu nome...
Fechei meu sonho, para chamá-la.
A tristeza transfigurou-me
como o luar que entra numa sala.

O último passo do destino
parará sem forma funesta,
e a noite oscilará como um dourado sino
derramando flores de festa.

Meus olhos estarão sobre espelhos, pensando
nos caminhos que existem dentro das coisas transparentes.

E um campo de estrelas irá brotando
atrás das lembranças ardentes.

quarta-feira, março 08, 2006

Ode ao Ciúme

David Mourão-Ferreira

Igual aos deuses me parece,
quem a teu lado vai sentar-se.
Quem saboreia a tua voz,
mais as delícias desse riso.

Que me derrete o coração,
e o faz bater sobre os meus lábios.
Assim que vejo esse teu rosto,
quebra-se logo a minha voz.

Sobe-me um fogo sob a pele,
seca-me a língua entre os dentes,
ficam-me surdos os ouvidos,
e os olhos cegos de repente.

Torna-se líquido o meu corpo,
Transpiro e tremo ao mesmo tempo.
Vejo-me verde, mais que a erva!
Só, por acaso, é que não morro!

domingo, março 05, 2006

Desespero

José Carlos Ary dos Santos

Não eram meus os olhos que te olharam
Nem este corpo exausto que despi
Nem os lábios sedentos que poisaram
No mais secreto do que existe em ti.

Não eram meus os dedos que tocaram
Tua falsa beleza, em que não vi
Mais que os vícios que um dia me geraram
E me perseguem desde que nasci.

Não fui eu que te quis. E não sou eu
Que hoje te aspiro e embalo e gemo e canto,
Possesso desta raiva que me deu
A grande solidão que de ti espero.

A voz com que te chamo é o desencanto
E o espermen que te dou, o desespero.

segunda-feira, fevereiro 27, 2006

Não

Álvaro de Campos

Não, não é cansaço...
É uma quantidade de desilusão
Que se me entranha na espécie de pensar,
E um domingo às avessas
Do sentimento,
Um feriado passado no abismo...
Não, cansaço não é...
É eu estar existindo
E também o mundo,
Com tudo aquilo que contém,
Como tudo aquilo que nele se desdobra
E afinal é a mesma coisa variada em cópias iguais.

Não. Cansaço por quê?
É uma sensação abstrata
Da vida concreta —
Qualquer coisa como um grito
Por dar,
Qualquer coisa como uma angústia
Por sofrer,
Ou por sofrer completamente,
Ou por sofrer como...
Sim, ou por sofrer como...
Isso mesmo, como...

Como quê?...
Se soubesse, não haveria em mim este falso cansaço.

(Ai, cegos que cantam na rua,
Que formidável realejo
Que é a guitarra de um, e a viola do outro, e a voz dela!)

Porque oiço, vejo.
Confesso: é cansaço!...

sábado, fevereiro 25, 2006

Mulher de idade atrás do balcão numa cidade pequena

Pearl Jam

Eu acho que reconheço o teu rosto
Provocante, familiar, mas ainda assim
não consigo situá-lo
Não consigo encontrar a chama de pensamento
para acender teu nome

Uma vida inteira se apossa de mim
Todas essas mudanças tomando lugar,
Eu queira poder ter visto o lugar
Mas ninguém jamais me levou
Corações e pensamentos, eles se esvaem
E desaparecem...

Eu juro que reconheço a tua respiração
Memórias como se fossem impressões digitais
estão lentamente aparecendo
De mim você não deve se lembrar, pois
Não estou como costumava ser
É difícil quando você fica atolado na areia
Eu mudei, mas não por completo,
A cidade pequena vaticinou meu destino.
Talvez seja isso o que ninguém quer ver

Eu sou quero gritar... Olá!
Meu Deus, há quanto tempo...
Nunca sonhei que você voltaria...
Mas aí está você, e aqui eu estou.
Corações e pensamentos, eles se esvaem
E desaparecem...

Corações e pensamentos, eles se esvaem
E desaparecem...
Corações e pensamentos
Desparecem...



Elderly Woman Behind The Counter in a Small Town

Pearl Jam

I seem to
recognize your face
Haunting, familiar, yet I can’t seem to place it
Cannot find the candle of thought to light your name
Lifetimes are catching up with me
All these changes taking place,
I wish I’d seen the place
But no one’s ever taken me
Hearts and thoughts they fade,
Fade away...

I swear I recognize your breath
Memories like
fingerprints are slowly raising
Me you wouldn’t recall, for
I’m not my former
It’s hard when you’re stuck upon the shelf
I changed by not changing at all,
small town predicts my fate
Perhaps that’s what no one wants to see
I just want to scream...
Hello...
My God it’s been so long,
Never dreamed you’d return
But now here you are, and here I am
Hearts
and thoughts they fade...
Away...

Hearts and thoughts they fade,
fade away...
Hearts and thoughts they fade...away...
Hearts and thoughts
they fade, fade away...
Hearts and thoughts they fade...

terça-feira, fevereiro 21, 2006

Down in a hole

Alice in Chains

Enterre-me suavemente neste útero
Eu dou esta parte de mim para você
Cai uma chuva de areia e aqui eu sento
Segurando flores raras
Numa cova...
Florescendo...

Estou num buraco e não sei posso ser salvo
Veja meu coração, eu o decorei como um túmulo
Você não entende em quem eles pensam
que eu deveria ter me tornado
Olhe para mim agora, sou um homem
Que não se permitirá ser si mesmo

Dentro de um buraco,
Perdendo minha alma
Dentro de um buraco,
Perdendo o controle
Eu queria voar,
Mas minhas asas foram negadas

Estou num buraco e já colocaram todas
as pedras em seu lugar
Já tomei tanto Sol que minha língua
teve até o paladar queimado
Eu fui o culpado
De me chutar nos dentes
Eu não falarei mais
Do que sinto por dentro

Dentro de um buraco,
Perdendo minha alma
Dentro de um buraco,
Perdendo o controle
Eu queria voar
Mas minhas asas foram negadas

Enterre-me suavemente neste útero
Como eu queria estar dentro de você
Eu dou esta parte de mim para você
Como eu queria estar dentro de você
Cai uma chuva de areia e aqui eu sento
Segurando flores raras
Como eu queria estar dentro de você
Numa cova...
Florescendo...
Como eu queria estar dentro...

Dentro de um buraco,
Perdendo minha alma
Dentro de um buraco,
Sentindo-me tão pequeno
Dentro de um buraco,
Perdendo minha alma,
Dentro de um buraco,
Fora de controle
Eu queria voar
Mas minhas asas foram negadas



Down in a hole
Alice in Chains

Bury me softly in this womb
I give this part of me for you
Sand rains down and here I sit
Holding rare flowers
In a tomb...
in bloom…

Down in a hole and I don’t know if I can be saved
See my heart I decorate it like a grave
You don’t understand who they
Thought I was supposed to be
Look at me now I'm a man
Who won’t let himself be

Down in a hole,
losin’ my soul
Down in a hole,
losin’ control
I’d like to fly,
But my wings have been so denied

Down in a hole and they’ve put all
The stones in their place
I’ve eaten the sun so my tongue
Has been burned of the taste
I have been guilty
Of kicking myself in the teeth
I will speak no more
Of my feelings beneath

Down in a hole,
losin’ my soul
Down in a hole,
losin’ control
I’d like to fly
but my Wings have been so denied

Bury me softly in this womb
Oh, I want to be inside of you
I give this part of me for you
Oh, I want to be inside of you
Sand rains down and here I sit
Holding rare flowers
Oh, I want to be inside of you
In a tomb...
In bloom...
Oh, I want to be inside...

Down in a hole,
losin’ my soul
Down in a hole,
feelin’ so small
Down in a hole,
losin’ my soul
Down in a hole,
out of control
I’d like to fly
but my Wings have been so denied

sábado, fevereiro 18, 2006

Por siempre jamás

Para aproveitar minha deprê, e também para inaugurar a lista de poemas, segue abaixo a tradução para uma poesia do Pérez Bonalde.

Para todo sempre!
Juan Antonio Pérez Bonalde

Traze-me uma caixa
de negra nogueira,
e nela deixa-me
por fim repousar.

De um lado meus sonhos
de amor coloca,
do outro,
minhas ânsias
de glória imortal;

A lira em minhas mãos
piedosas deixa,
e abaixo da almofada
meu formoso ideal...

Agora a tampa
traze e crava,
crava-a, crava-a
com força tenaz,
que nada meu
possa-me roubar...

Depois, uma cova
bem funda cava,
tão funda, tão funda,
que até ela jamais
alcance o ruído
do mundo a chegar.

Baixa-me a seu fundo,
a terra junta,
Cubra-me... e vá
embora
Deixando-me em paz...

Nem flores, nem lápide,
Nem cruz,
nem funeral;
E logo... esqueça-me
Para todo o sempre!



E a versão original:

Por Siempre Jamás!
Juan Antonio Pérez Bonalde

Traedme una caja
de negro nogal,
y en ella dejadme
por fin
reposar.

De un lado mis sueños
de amor colocad, del otro,
mis ansias
de gloria inmortal;

la lira en mis manos
piadosos dejad,
y bajo la almohada
mi hermoso ideal...

Ahora la tapa
traed y clavad,
clavadla, clavadlac
on fuerza tenaz,
que nadie lo mío
me pueda robar...

Después, una fosa
bien honda cavad,
tan honda,
tan honda,
que hasta ella jamás
alcance el ruido
del mundo a llegar.

Bajadme a su fondo,
la tierra juntad,
cubridme...
y marchaos
dejándome en paz...

¡Ni flores, ni losa,
ni cruz, ni funeral;
y luego...olvidadme
por siempre jamás!.

Dove cè poesia

Mais um blog... Putz, mas para quê?

Vamos lá. A idéia de criar outro blog veio de uma obsessão minha de sistematizar tudo que faço. Percebi que o caos tomou dos outros blogs que fiz, por isso, resolvi criar um espaço dedicado somente à poesia.

Mas aí você pergunta: Porque o título é em italiano?, e eu respondo: e porque não?

Devido às suas vogais abertas, a língua italiana tem uma grande sonoridade para a poesia e para a música. Além disso, o título em italiano é, de certa forma, uma homenagem à poetas importantíssimos para a poesia mundial, como por exemplo, Dante e Petrarca.

Mas o fato do título ser em italiano não significa que aqui serão publicados somente poemas stilonovistas e seus compatriotas. Pretendo postar poesias de todas as nacionalidades, gêneros e sabores...

Até mais.


*Ah, já ia quase esquecendo, o título quer dizer "onde há poesia, ainda há vida".